quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Pintura íntima


Por João Paulo Vieira
- o que é eterno, Iaiá Lindinha?
- Ingrato! É o amor que te tenho.
Quase nada é por acaso.
Não me importa muito a razão pela qual as coisas acontecem. Nunca me importou. Mas é que a forma como tudo se passa me impressiona. A capacidade como os dias passam deixando a sensação de que certas coisas não são passageiras, e que alguma coisa de fato mudou. Mas o que acontece por dentro é de uma complexidade inexplicável. Essa pintura interna, íntima, que me reveste inteiro de traços inteligíveis e faz de mim um eterno perguntador. Estou em dúvida. Mas tenho certeza do que vou vivendo. Fui arrebatado subitamente por um sentimento hilariante de eternidade. No eterno, nada faz sentido. Porque as coisas não tem pressa. Quando se é eterno, não se pode ser por inteiro. Quando não há fim, a vida vai passando diante dos seus olhos e deixa na boca um gosto de frustração. No eterno não há paz, porque não vai haver fim. O fim, o ápice, o efêmero. É nisso que há beleza na vida. Não há como encontrar beleza na eternidade. A vida não é eterna por acaso. A vida é um trajeto finito e por isso feliz, é uma história que termina sem mais nem menos e sem explicação, apenas pra mostrar que as coisas só acabam quando terminam. Sigo enfeitiçado pelo que há por dentro, e olhando cada vez mais fundo me perco por completo. Não dá pra lidar com coisas eternas assim tão facilmente. E ando perdido, precisando que me desliguem que me tirem de mim. Que me proíbam de me importar tanto com o que não tem juízo, de me ferir com as armas que eu mesmo construo com a minha covardia. Só precisava que esse eterno que carrego comigo fosse menos destrutivo e exigente. E que nós pudéssemos conviver em paz, sem me exigir nada em troca. Que eu pudesse guardá-lo num canto até que a poeira me cobrisse os olhos. E que eu pudesse me esquecer de que é parte de mim, até que a vida se encarregue de usar das armas que só ela tem pra acabar com esse deboche com o qual a eternidade olha dentro dos meus olhos e me implora por só mais um pouco de coragem. Ando cansado de me pintar, e de fazer um novo rabisco em cada canto branco que encontro perdido ainda sobre a tela. Me cega olhar tanto pra tanta eternidade, me mata ficar parado diante desse quadro que não tem mais fim. Não preciso de muito. Só quero a paz da banalidade, pelo menos um pouco do conforto que a negligência traz. Ando cansado das coisas grandes. Das coisas belas, tão mal resolvidas. E dessa sensação de ingrata eternidade. Porque a vida é suja, maltrapilha e mesmo assim diária. E é preciso ainda um lugar pra descansar.

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